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sexta-feira, 12 de dezembro de 2014

É preciso reformar a política para democratizar a comunicação e democratizar a comunicação para reformar a política

Na semana em que é celebrado o Dia Internacional dos Direitos Humanos as pautas lutas pela democratização da comunicação e reforma política se juntam para fortalecer a democracia no Brasil.
Catarina de Angola - Asacom
Recife - PE
10/12/2014
 
Neste dia 10 de dezembro é celebrado o Dia Internacional dos Direitos Humanos. Durante a semana atividades serão realizadas em todo o mundo para celebrar a data. No Brasil, movimentos e pessoas que lutam pela democratização da comunicação e a reforma do sistema político brasileiro, a partir de uma constituinte exclusiva e soberana, juntaram forças. “Dizemos que essas são pautas irmãs gêmeas siamesas. Não dá pra desassociar uma da outra, porque ao mesmo tempo que é difícil a gente pautar a reforma política sem ter uma abertura na mídia, só por meio das redes sociais e meios alternativos, a gente acha importante que tenha reforma política pra que se possa pautar a democratização da comunicação”, explica Marcones Oliveira, da Secretaria Operativa do Plebiscito Constituinte/Pernambuco.

Este ano completam-se cinco anos da I Conferência Nacional de Comunicação (Confecom), realizada em 2009, em Brasília, e de lá para cá não houve outro processo de conferências nesta área, e as mais de 600 propostas aprovadas na Confecom quase não saíram do papel. Desde 2012, diversas organizações da sociedade civil estão mobilizadas na campanha "Para Expressar a Liberdade – Uma nova lei para um novo tempo”, que propõe uma nova Lei Geral das Comunicações para o Brasil, uma Lei de Mídia Democrática, pois o atual Código Brasileiro de Telecomunicações tem 52 anos e não consegue dar conta da diversidade do país, nem das mudanças vivenciadas ao longo desse tempo. A campanha está no processo de coleta de assinaturas para que se apresente como projeto de iniciativa popular à Câmara dos Deputados e precisa de 1 milhão e quatrocentas mil assinaturas. Também acreditando na mobilização popular e participação direta das pessoas, no mês de setembro deste ano, a campanha por um Plebiscito Popular por uma Constituinte Exclusiva do Sistema Político, coletou quase oito milhões de assinaturas a favor do plebiscito. São oito milhões de pessoas que disseram que sim, querem mudar o sistema político brasileiro, pois não se sentem representados nele da forma como é hoje.

 
Não haverá de fato uma reforma política sem haver um debate sobre comunicação como direito de todas as pessoas e para isso a democratização dos meios de comunicação. E a partir desse contexto, as campanhas pelo Plebiscito Constituinte e da Lei de Mídia Democrática têm juntado forças. Esta semana diversas atividades têm ocorrido em vários estados para coleta de assinaturas pela Lei de Mídia Democrática. “É muito difícil acreditar que a gente vai conseguir uma regulamentação dos artigos da Constituição que falam de radiodifusão a partir de um Congresso brasileiro onde você tem muitos deputados e deputadas que têm interesses pessoais nesse campo, deputados que são radiodifusores, que têm parceria com grandes empresas de comunicação. Ao mesmo tempo em que essas concessões de rádio e televisão que esses deputados e deputadas têm são utilizadas na época de campanha para que eles possam ser reeleitos cada vez mais”, explica Ivan Moraes, integrante do Centro de Cultura Luiz Freire e do Fórum Pernambucano de Comunicação.

O atual contexto que o Brasil vivencia no campo da comunicação é o de negação da diversidade e pluralidade de vozes brasileiras. O Semiárido é um dos exemplos dessa negação de voz. A imagem construída sobre a região, e reforçada pelos meios de comunicação, sempre foi o a da terra rachada, sem água e de pobreza, um lugar inviável, sem possibilidades. Essa imagem foi fortalecida pela atuação da política do combate à seca, baseada na concentração da água em terras de grandes fazendeiros, fazendo com que a maioria da população ficasse dependente de ações assistencialistas dos poderes públicos. Mas a proposta de convivência com o Semiárido defendida pela Articulação Semiárido Brasileiro (ASA), rede formada por mais de três mil organizações que atuam pelo desenvolvimento do Semiárido brasileiro, vem consolidando uma nova imagem da região, principalmente, a partir da valorização do conhecimento local. “A ASA trabalha a comunicação na perspectiva do direito humano porque acreditamos que é necessário visibilizar nossas lutas, nossa cultura, nosso conhecimento”, afirma Valquiria Lima, coordenadora executiva da ASA pelo estado de Minas Gerais. 

Joel Xakriabá (centro) fala sobre a experiência
de comunicação da tribo, no Encontro Estadual
de Comunicação da ASA Minas Gerais.
A mesma situação é vivenciada pelos povos indígenas e outros povos tradicionais. Ao longo da história, eles sempre tiveram o direito à terra e expressão da sua cultura negados. Foram escravizados e mortos pelo processo de colonização e ainda o são pelo projeto de desenvolvimento em curso, mas isso dificilmente é pautado pelos grandes meios de comunicação como forma de evidenciar a necessidade de ter a luta pela retomada de seus direitos fortalecida. Pelo contrário, a imagem reforçada pela mídia muitas vezes é a ideia de que são uma população preguiçosa e que querem se apossar de terras que não são suas. Como forma de conseguirem expressar suas lutas e de valorizar suas ações, o povo indígena Xakriabá, no Semiárido mineiro, tem colocado seu direito à comunicação em prática por meios próprios.

Joel Gonçalves de Oliveira , conhecido como Joel Xakriabá, que é professor da sua própria aldeia, explica que sempre tiveram a comunicação como algo forte na comunidade, mas que com o tempo e por conta da colonização algumas práticas foram se perdendo. “Nossa língua foi reprimida pelos colonizadores e mesmo nos dias atuais as pessoas que ainda têm conhecimento da língua tem o medo de falar. E esse medo faz com que a língua se perca. Por isso tem uma família que está fazendo um dicionário na língua Xakriabá, para que possamos resgatá-la”, conta Joel. Ele afirma que antigamente utilizavam principalmente a observação e os elementos naturais como forma de comunicação, galhos, pedras, recados, entre outras. Com o tempo veio a escrita e com isso as cartas. No entanto, quem dava aulas eram professores brancos que não fortaleciam a cultura local. “Com a escola indígena os índios começaram a dar aulas”, explica Joel. 

Hoje eles sentem a necessidade de se comunicar também a partir de outras técnicas, principalmente acessar as outras tecnologias disponíveis. A chegada da energia elétrica aconteceu apenas em 2000 e com isso foram em busca do direito e do acesso a outras formas de comunicação. Hoje o Ponto de Cultura Loas Xakriabá possibilita a produção da experiência de comunicação da própria comunidade, a partir da participação principalmente de jovens. Eles têm uma editora própria de livros e publicações, uma produtora de vídeos e diversas outras iniciativas, como a do resgate da língua Xakriabá. E estão no aguardo para implementarem uma rádio comunitária. “Queremos fazer uma rádio diferenciada”, afirma Joel. No entanto, a implementação da rádio dos Xakriabá tem esbarrado na burocracia do país para implementação de rádios comunitárias. O processo é bastante lento. O projeto por uma nova Lei de Mídia Democrática trata também dessa questão.


 

Para Ivan Moraes Filho o fato de não termos uma comunicação democrática no país toca todas as pessoas, principalmente a quem está nos interiores dos estados porque o acesso a uma informação diversa é menor ainda. “Quem vive no sítio, na zona rural, no interior às vezes conta com uma rádio, as vezes a rádio é do prefeito, pra te dizer aquilo que tá acontecendo e aquilo que não tá acontecendo. Então tem um monopólio da censura que precisa acabar no Brasil e eu tenho certeza absoluta que a população que vive no campo, que vive no interior, ela é a que mais tem a ganhar com a reforma da mídia, porque ela vai pela primeira vez conseguir se comunicar de forma transparente, de forma horizontal, de forma democrática e vai ter um empoderamento diante do poder público que jamais foi visto nesse país. O nome disso é democracia”, pontua.

Diante desse contexto é que as campanhas se unem, pois é preciso democratizar a política para democratizar a comunicação e democratizar a comunicação para democratizar a política. “A reforma politica é muitas vezes o primeiro passo pra que a gente tenha algumas reformas estruturantes para reformar a democracia. Fazendo a reforma politica a gente pode pautar outras reformas que estão empacadas historicamente, e a democratização da mídia em alguns países só conseguiu ser pautada após uma reforma do sistema político”, pontua Marcondes Oliveira.

Para Valquiria Lima o fortalecimento das duas pautas é o fortalecimento da democracia. “Não dá para separar a política da comunicação. A comunicação está concentrada nas mãos de poucas famílias no país. Ou a gente democratiza o direito à comunicação ou não conseguiremos fazer uma reforma política que dê conta da necessidade do povo e com participação de toda sociedade”, afirma.

Comunicação como direito – Em setembro a Articulação Semiárido Brasileiro - ASA promoveu um Encontro Nacional de Comunicação que resultou numa carta política que reforça sua luta pelo direito humano à comunicação. (Clique aqui para ter acesso à carta). E desde o mês de novembro, a rede vem promovendo encontros estaduais com foco na comunicação como direito humano e a comunicação popular e comunitária. As redes estaduais que compõem a ASA estão realizando os encontros com a participação de comunicadores e comunicadoras populares, agricultores e agricultoras e integrantes das organizações que compõem a rede. O objetivo dos encontros é de fortalecer a comunicação como processo político dentro da ASA.

Lei de Mídia Democrática - A campanha "Para Expressar a Liberdade – Uma nova lei para um novo tempo” é uma iniciativa de diversas organizações da sociedade civil que acreditam que uma nova lei geral de comunicações, uma lei de mídia democrática, é necessária para mudar a situação de concentração de meios de comunicação e com isso a concentração de vozes, onde apenas poucos grupos econômicos controlam a comunicação. A campanha pede uma nova lei onde todos possam garantir o seu direito de se expressar. Para uma comunicação democrática, diversa e plural. Para conhecer e participar da campanha com a coleta de assinatura é só acessar o site http://paraexpressaraliberdade.org.br . Até agora pouco mais de 100 mil assinaturas foram coletadas. A participação da sociedade é fundamental para levar à proposta ao Legislativo. Por isso, é importante que a coleta de assinaturas se intensifique em todo o país.

Plebiscito Constituinte – Na semana de 1º a 7 de setembro a Campanha Nacional pelo Plebiscito realizou um Plebiscito Popular por uma Constituinte Exclusiva e Soberana do Sistema Político. Cerca de 8 milhões de pessoas responderam “Sim” a pergunta “Você é a favor de uma Constituinte Exclusiva e Soberana do Sistema Político?”. Agora, o principal foco da Campanha é a mobilização em torno da convocação de um Plebiscito oficial pelo governo brasileiro, pelas vias do poder legislativo e ou executivo, pois o plebiscito também pode ser convocado via um decreto presidencial. A Campanha Nacional pelo Plebiscito é integrada por cerca de 400 movimentos e organizações sociais. Para saber mais acesse:http://www.plebiscitoconstituinte.org.br

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